De Hong Kong a Sangrila

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“O confucionismo é a filosofia das autoridades, dos funcionários, da estrutura, da ordem, de ficar em posição de sentido, enquanto o taosimo é a sabedoria daqueles que se recusam a participar do jogo e querem apenas ser parte de uma natureza alheia a tudo” – Ryszard Kapuscinsky

São várias Chinas sobrepostas. Como os viadutos das grandes cidades. Gente moderna caminha pelas ruas, com suas missões bem definidas na cabeça. Velhos em carroças levam montes de feno ignorando o buzinaço dos modernos ônibus sino-suecos rasgando a autoestrada. Motoristas recém habilitados conduzem enormes Audis. Buzinam. Fazem conversões proibidas. Avançam sobre os pedestres. E buzinam.

Nos prédios públicos ainda reluz o brasão da República Popular da China. Organogramas do partido destacam o funcionário do mês. Ali está tudo limpo. Do outro lado da rua, tudo esta sendo limpo. Tudo está em reforma. Os canteiros ajardinados. A fiação elétrica aterrada. O meio fio é desenhado em pedra bruta.

Aqui o espaço público parece ter mais importãncia que o privado. Grandes prédios envidraçados espelham a cidade. Imponentes de longe, de perto tem um acabamento tosco. Espaços escuros, ocos, guardam bicicletas, vigiadas por um homem segurando o pé.

Do outro lado da rua uma barraca frita o macarrão. Crianças se acotovelam. Sentados em banquetas, os trabalhadores riem e fumam o fim do almoço. E ninguém reclama. Se esbarram, ninguém reclama. O pop chinês berra nos coletivos, não deixa dormir. Dorme-se.

Vivem um mundo paralelo. A China e as outras coisas. Submetem o capitalismo ao seu partido. Crescem para todos os lados. Olham para frente. Ninguem reclama dos acotovelamentos do dia-a-dia. Sabem que não podem reclamar muito. E olham para frente.

Uma estranha mistura como a que compõe o asfalto rugoso das rotas de saída. O orgulhoso burocrata sai de sua Pajero e vai jogar cartas no hotel de luxo. Ele, o chinês da construtora e o chefe de polícia – que circula numa viatura BMW – tem um conchavo.

Uma nova China está nascendo e são eles que vão conduzí-la.