Bollywood

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Assisti recentemente a uma sequência de filmes de Bollywood, a vigorosa indústria do cinema indiano. Os estúdios e produtores locais dividem um imenso mercado, criando suas próprias histórias e idolos. As estrelas em Bollywood vivem num mundo à parte. Num país acostumado a idolatria, esses artistas são reverenciados diariamente nos jornais e revistas e formam uma classe de privilegiados um tanto descolada da realidade indiana. Como aliás os próprios filmes. Se no parco cinema brasileiro há uma excesso de realismo, em Mumbai fica difícil identificar uma Índia real nos enredos. Até as ruas da cidade passam por, digamos, uma higienização. As cenas externas, uma perseguição de carros por exemplo, mostram ruas limpas, carros novos e um trânsito bem comportado. Nada menos indiano.

O maior ídolo das telas indianas é Amitabh Bachchan. No início desse ano, em retribuição a sua performance em Eklavya, o diretor Vidhu Vinod Chopra lhe fez um agrado. Estacionou na garagem do Big B, como o astro é conhecido, um Rolls Royce Phanton. Outro carro de luxo rondou a vida de Bachchan em 2007. Um reluzente Bentley “apareceu” na casa de seu filho Abhishek. Os jornais especularam se seria um presente de aniversário do pai ou fruto de um desvio do líder do poderoso Partido Socialista Democrático da Índia, amigo da família, que teria encomendado o carro em nome de Big B. Os folhetins impressos e eletrônicos se regozijaram com a dúvida.

Abhishek poderá ser visto em São Paulo em Dhoom2, durante a I Mostra de filmes de Bollywood na Cinemateca, entre 7 a 11 de marco de 2007.

A filmografia indiana é feita de filmes de aventura ou romances. E invariavelmente são músicais. Em Dhoom2, um ladrão sofisticado enfrenta uma dupla de policiais pelas ruas de Mumbai e até no Rio de Janeiro, sempre acompanhados de duas garotas, por assim dizer, estonteantes. O filme é tosco. As cenas de dança beiram o patético. O roteiro é cheio de furos. Ainda assim milhões de indianos correram para as salas garantindo o posto de maior sucesso do cinema indiano em 2006. Na sessão que assisti em Mumbai em fevereiro, uma imagem em movimento da bandeira indiana foi projetada enquanto o hino nacional era acompanhado pela platéia, respeitosamente de pé. No intervalo do filme, mulheres de burca, casais de adolescentes, senhores de terno e garvata. Tudo é muito surreal.

Outro destaque da Mostra é “Dilwale dulhania le jayenge”, uma comédia romântica recordista. Ficou 10 anos em cartaz na Índia e projetou outro ícone da telas, Shahrukh Khan. Vi Khan em DVD como protagonista de um arrasa quarteirões de Mumbai, Kal Ho Naa Ho, de 2004. O filme como de praxe, é longo. Leva 190 minutos, uns 40 dos quais dedicados aos números músicais. Foi todo rodado em Nova York e mostra um triângulo amoroso um tanto trágico. A mensagem benevolente do amor eterno transcendendo o imediatismo das paixões terrenas é simplória e limitada. Como curiosidade, é divertido.

Para fugir a regra, a melhor pedida da mostra é o independente “O Terrorista”, um filme político selecionado em Sundance, cujos direitos para os EUA pertencem a John Malkovitch. Uma indústria grande como indiana, também abre suas brechas para novos e bons realizadores. É uma tendência a conferir. Em breve será comum ver filmes de qualidade, com o perdão do trocadilho, Off-Bollywood.

A tradição industrial do cinema na Ásia não é exclusividade da Índia. O Paquistão também tem sua Lollywood, baseada em Lahore. O Irã já experimentou melhores dias, mas também tem uma indústria e agora a China, lançando produções caríssimas e bem realizadas, voltadas para o mercado interno, mas com potencial para aplacar as massivas audiências asiáticas.

Óbvio que o cinema permeia a sociedade indiana como as novelas a brasileira. Suas fantasias desmesuradas chegam a ser falaciosas. Os enredos absurdos não se confundem com a realidade. No final das contas é menos hipócrita que a onda de realismo engajado dos últimos folhetins globais.