Capote

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“Nasci para escrever. Cada livro meu é uma estréia penosa e feliz. Essa capacidade de me renovar toda à medida que o tempo passa é o que chamo de viver e escrever.” Clarice Linspector

Capote é um típico filme americano de primeira linha. Roteiro e direção seguros, um grande ator na linha de frente, ambientação impecável. Do personagem principal – Truman Capote e tudo que o circunda – até a vida interiorana e conservadora, onde se passa o livro “A sangue frio”, tudo é muito americano, tudo tem uma cara já vista.

Afora a interpretação premiada de Philip Seymour Hoffman, há outro grande trunfo que dá uma certa universalidade ao filme. O processo criativo em que Capote se envolve, obcecado por sí, por sua obra e personagem, poderia acontecer em qualquer tempo e qualquer lugar. Ser um escritor não é tarefa fácil. Ser um grande escritor uma aventura para poucos. Envolver-se dessa maneira com o tema de seu livro, pode ser um martírio, como de fato o filme sugere.

Essa espécie de loucura que acomete o autor em busca de sua obra me lembrou a lama moral dos últimos dias de Hitler, retratados magnificamente por Oliver Hirschbiegel em “A Queda” com o não menos brilhante Bruno Ganz no papel do ditador em franca decadência. Tomado pela própria insanidade, Hitler imagina ainda poder reverter a guerra perdida, ordenando todos a sua volta a aderirem a sua viagem sem volta.

Não há comparação entre as manipulações egocêntricas de Truman Capote com o besta hitleriana, mas a pergunta que me apareceu no final é: como afinal de contas Bruno Ganz fez para deixar Hitler no set de filmagem, voltar para casa e dormir tranquilo?